O assunto é recorrente, mas sempre atual. Até porque, a cada dia temos muitas novidades, novas tecnologias, novos players no mercado e, claro, a movimentação da grande mídia, tentando se adaptar, sobreviver, renascer depois da revolução digital.
É fato que, após a web colaborativa, que deu poder de emissor a qualquer cidadão conectado, os veículos tradicionais perderam muito. Perderam audiência, anunciantes, volume de verba publicitária e, também, o glamour, o poder, o status de “above the line”. Revistas foram extintas, Jornais se tornaram digitais, emissoras de Rádio e Televisão travam uma luta diária em busca de sua reinvenção.
E é sobre essa reinvenção que vamos falar um pouco. Especificamente com foco no que a poderosa Rede Globo vem fazendo para se conectar, literalmente, com uma geração multitela, dispersa, exigente e com hábitos de consumo de mídia completamente disruptivos. E quando a Globo se movimenta, é melhor colocar um olhar analítico em suas ações.
Desde 2013, quando Sergio Valente, ex-presidente da DM9DDB, assumiu a direção da Central Globo de Comunicação, as mudanças começaram em ritmo acelerado. A visão publicitária dominou o pensamento e a Globo nunca mais foi a mesma. Nova identidade visual, novos formatos comerciais, uma nova postura com o mercado publicitário e, recentemente e definitivamente, uma nova forma de unir o on e off em suas estratégias de produção de conteúdo e busca de aumento da audiência.
Só para focarmos nas ações mais recentes, vamos lembrar de Vivi Guedes, personagem de Paola Oliveira na novela A dona do pedaço. A personagem ganhou um perfil real no Instagram e em menos de 24h, já contava com mais de 165 mil seguidores, misturando de forma criativa e pertinente, o on e off, o real e o fictício. Na mesma novela, o personagem de Caio Castro, Rock, um lutador de boxe, teve sua luta, ocorrida na novela, registrada como notícia no portal Globo.com, na seção do Globo Esporte. Mais uma vez um mix de realidade e ficção e, dessa vez, unindo, também, novela e jornalismo.
Agora, nada se compara ao que aconteceu no Big Brother Brasil 2020. A ideia de unir, no reality show, pessoas comuns e alguns digitais influencers se mostrou muito exitosa. Alguns números para exemplificar: o famoso paredão entre Guilherme e Pyong alcançou 30 pontos de audiência no Rio de Janeiro, 2,5 milhões de comentários nas redes sociais, 115 termos entre os mais comentados no Twitter Brasil e 21 no Twitter em todo mundo, além do recorde mundial de votos num programa de reality show, com 416 milhões de participações. Uma estratégia onde ganha o público, os anunciantes e, claro, a TV Globo.
O mais interessante de tudo isso é perceber o efeito na prática, na nossa vidinha real de todo dia. Minha filha, por exemplo, 12 anos, viciada em Tik Tok, apaixonada por Spotify e Instagram, avessa à propaganda, foi fisgada, através das redes sociais, por Vivi Guedes em a Dona do Pedaço e, depois, por Manu Gavassi, Rafa, Boca Rosa, Mari e, principalmente, por Bruna Marquezine, que transmitia o BBB 20 pelos stories de seu Instagram, com direito a comentários e muita torcida. Aliás, já ouvi depoimentos de pessoas que só acompanharam o programa pelo Instagram de Bruna.
O fato é que a Globo achou um caminho, o caminho inverso. Com sua inteligência e estratégias, está conseguindo trazer o público das redes sociais para o seu conteúdo. Está conseguindo fazer com que o seu conteúdo seja assunto nas redes. E essa via de mão dupla, esse vice-versa, essa recíproca verdadeira, está resultando em mais audiência para ela, seja pelo canal tradicional, pelas próprias redes ou pela Globo Play. Estamos vivenciando a reinvenção do maior veículo de comunicação do Brasil, que começa a aplicar essas estratégias em toda a sua programação, reformulando seu conteúdo a todo instante para se aproximar definitivamente de uma nova geração de consumidores, amantes das séries e da liberdade de escolha de como, quando e onde assistir o que é pertinente a eles. Uma verdadeira aula e diferentemente do quadro no Fantástico, quando o assunto é inovação na forma de gerar conteúdo e audiência, isso a Globo mostra.
Por Marcos Villas Boas, Sócio e Diretor de Criação da República